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Revisão de Benefício Previdenciário: fórmula progressiva 85/95 – aposentadoria dos pontos

Uma das mudanças mais recentes ocorrida no Regime Geral de Previdência Social é a instituição da chamada aposentadoria dos pontos ou aposentadoria pela regra progressiva 85/95, a qual tem causado diversas dúvidas e incertezas.

Com a Medida Provisória 676 de 17/06/15, os segurados vinculados ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS) passaram a contar com um novo tipo de cálculo para aposentadoria por tempo de contribuição, a chamada aposentadoria dos pontos.

Há muito tempo, o governo federal vem tentando a implementação da idade mínima para aposentadoria, aplicando medidas autoritárias para fazer valer a sua vontade em detrimento da vontade legitima do povo.

A primeira deturpação da vontade popular foi a instituição do fator previdenciário, adotada durante o governo Fernando Henrique Cardoso como alternativa à recusa da sociedade e do Congresso Nacional à exigência de idade mínima para aposentadoria por tempo de contribuição. A idade mínima foi barrada pelo Congresso em 1998 e o fator previdenciário foi aprovado em 1999 por intermédio da Lei n. 9.876/99.

De acordo com a fórmula do fator previdenciário, o valor da aposentadoria paga pela Previdência Social passou a ser calculado pela média aritmética dos 80% do período contributivo correspondente aos maiores salários de contribuição (corrigidos monetariamente pelo INPC) referentes ao período de julho de 1994 até a data do requerimento da aposentadoria por tempo de contribuição, sendo essa média multiplicada pelo fator. A redução no valor das aposentadorias provocada pelo fator previdenciário é, em média, de 40% para mulheres e de 35% para homens. No caso de professoras, a redução pode chegar a um montante até maior.

A mobilização pelo fim do fator previdenciário e em defesa dos aposentados é uma das prioridades da luta de vários movimentos sociais, os quais, com legitimidade e autoridade de discurso, pedem para o governo federal combater com veemência a malversação das verbas públicas e, com isso, cessar a supressão ou amesquinhamento dos direitos sociais a duras penas conquistados pela sociedade brasileira, como no caso das constantes reformas previdenciárias.

No entanto, o Partido dos Trabalhadores, nas gestões Lula e Dilma, ao invés de acabar com o fator previdenciário (seus componentes foram os que mais combateram a sua instituição no governo FHC) continuaram praticando a velha política dos partidos que adotam a cartilha neoliberal, ou seja, imputando as mazelas das crises econômicas na conta do trabalhador e do segurado do INSS.

A expectativa da sociedade brasileira foi claramente frustrada com a manutenção do fator previdenciário durante todos os anos de gestão do PT, muito embora tenha sido atenuado, em parte, os seus efeitos deletérios do odioso fator com a instituição da fórmula 85/95 ora comentada.

O governo do PT, não conseguindo efeito prático através da MP 664 de 2014 (ainda com constitucionalidade discutida no STF), convertida na Lei 11.135/2015, editou a MP 676/2015 (também com constitucionalidade discutida) criando fórmulas, num plano de fundo, desvantajosas para o trabalhador e, numa visão mais imediatista, com certas vantagens.

Ora, imagine-se um jovem que começa sua vida laboral hoje com 18 anos de idade e trabalha ininterruptamente, vertendo 35 anos de contribuição. Aos 53 anos de idade, terá, conforme a fórmula do governo 88 pontos. Se aposentar-se nessa idade, terá diminuída boa parte dos seus vencimentos pela incidência do fator previdenciário. Esse mesmo trabalhador terá que ficar mais 7 anos trabalhando para não ter a incidência do famigerado fator previdenciário. Ou seja, apenas aos 60 anos de idade, poderia se aposentar com seus proventos integrais.

A pergunta que se faz é a seguinte: conseguiu o Governo Federal, por vias transversas e de forma implícita, implementar o requisito da idade antes rejeitado pelo Congresso Nacional? Cremos que sim. A criação do fator previdenciário teve essa motivação e, agora, o governo federal novamente introduz a idade no cálculo do salário-de-benefício da aposentadoria por tempo de contribuição, ainda que seja para afastar a incidência do fator previdenciário.

Segundo o advogado e Presidente do IEPREV, Dr. Roberto de Carvalho Santos[1], não se pode asseverar que a fórmula apresentada pelo governo federal é prejudicial, numa visão econômica, ao segurado. Pelo contrário, ela é uma alternativa à incidência do fator previdenciário. Contudo, o citado professor concorda que a melhor opção política protetiva seria o fim do fator previdenciário e a não introdução de qualquer limite etário ainda que seja para a apuração do valor do salário-de-benefício da aposentadoria por tempo de contribuição, atendendo integralmente o comando constitucional.

1. A APOSENTADORIA POR PONTOS E AS SOLUÇÕES JURÍDICAS

A aposentadoria dos pontos teria por objetivo excluir a aplicação do fator previdenciário no benefício, que é o responsável por uma brusca redução do valor da aposentadoria do segurado. Pois bem, essa nova regra requer o preenchimento de dois requisitos, que é a soma do fator idade com tempo de contribuição, conhecida como fórmula 85/95. Nesta regra, a soma da idade da pessoa com o tempo de contribuição deve atingir os pontos previstos.

Em miúdos: no caso da mulher, a soma da idade com o tempo de contribuição (mínimo 30 anos) deve atingir 85 pontos. Ou seja, uma mulher que aos 30 anos de serviço e completa 55 anos, poderia se aposentar com base nesta regra, sem a incidência de fator previdenciário. No caso do homem, a soma da idade com o tempo de contribuição deve atingir os 95 pontos ( com o mínimo de 35 anos de contribuição) para que possa exercer o direito à aposentadoria sem a incidência do fator previdenciário. Assim, um homem que contribuiu por 35 anos e, hoje, completa 60 anos de idade, teria direito à se aposentar sem a incidência do fator previdenciário.

Entretanto, a partir de 05/11/2015, com a vigência da lei 13.185/15, essa regra passou a ser conhecida como fórmula 85/95 progressiva, justamente porque com o passar dos anos a fórmula aumenta até o limite de 90/100, levando-se em conta que a expectativa de vida dos brasileiros tende a crescer (discordamos desse parâmetro e nesse diapasão citamos o artigo do professor Alan da Costa Macedo sobre a inconstitucionalidade da MP 664[2].)

A expectativa de vida foi apresentada pelo governo através de dados não confiáveis e em estudos encomendados por ele. Em nenhum momento, observamos, naquela tábua, as variáveis epidemiológicas do câncer, ao lado das doenças do aparelho circulatório, causas externas, doenças do aparelho respiratório, afecções do período perinatal e doenças infecciosas e parasitárias.[3]
Abaixo, os pontos que devem ser atingidos pelos segurados em determinado ano, conforme previsão do §2º do artigo 29-c da Lei 13.183/15:

31/12/2018 – 86 para mulheres e 96 para homens
31/12/2020 – 87 para mulheres e 97 para homens
31/12/2022 – 88 para mulheres e 98 para homens
31/12/2024 – 89 para mulheres e 99 para homens
31/12/2026 – 90 para mulheres e 100 para homens

Como se pode observar, se o segurado completa os requisitos para se aposentar nos anos acima mencionados, sua regra não é mais a 85/95, passando-se a exigir a nova pontuação para que possa fazer jus a isenção do fator previdenciário. Importante reiterar que essa modalidade de aposentadoria manteve a exigência mínima de 35 anos de contribuição para homem ou 30 anos para mulher.

O Governo quis fazer entender que não haveria limite de idade mínimo de idade, mas como já demonstramos na análise político–jurídica, entendemos que houve, sim, por via obliqua a inserção do requisito da idade através dessa nova fórmula.

A lei 8213/91, alterada pela Lei 13.183/2015 permite que sejam somadas frações de meses completos, isto quer dizer que aquele que possui 35 anos e seis meses de contribuição e 59 anos e seis meses de idade, no caso de segurado homem pode se aposentar com a fórmula 85/95.
A regra da aposentadoria dos pontos também pode ser aplicada aos professores, nos termos do artigo 29-c, §3° da Lei 13.183/15, cuja redação dispõe que:

“Art. 29-C, § 3º Para efeito de aplicação do disposto no caput e no § 2º, o tempo mínimo de contribuição do professor e da professora que comprovarem exclusivamente tempo de efetivo exercício de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio será de, respectivamente, trinta e vinte e cinco anos, eserão acrescidos cinco pontos à soma da idade com o tempo de contribuição.”

Assim, o professor que já possui a benesse de se aposentar com 5 anos a menos de contribuição, também pode se beneficiar da regra para afastar a aplicação do fator previdenciário, apesar de já utilizarmos a tese da não incidência de fator previdenciário para o professor, diante do entendimento de que sua aposentadoria é especial e não sujeita ao fator, por conseguinte.
Quanto à aposentadoria especial, prevista no artigo 57 da Lei 8.213/91, sabe-se que já não há a aplicação do fator previdenciário, nos termos do artigo 18, I, alínea d, Lei 8.213/91, assim, certamente a regra 85/95 não poderá ser aplicada nesse tipo aposentadoria, já que seu objetivo é justamente eliminar a aplicação do fator previdenciário, o qual já não é utilizado nessa aposentadoria.

Outro ponto de destaque é que não foi extinta ou modificada nenhum dos tipos de aposentadoria anteriormente existentes, apenas se criou uma alternativa a aplicação do fator previdenciário, portanto, permanecem inalteradas as regras para aposentadoria por idade, por tempo de contribuição, por invalidez e especial.
Não há dúvidas de que aqueles que fizeram seu requerimento perante o INSS após a instituição da aposentadoria dos pontos poderá optar pela regra que lhe for mais vantajosa, que, diga-se de passagem, constitui obrigação do servidor orientar o segurado nesse sentido, conforme artigo 687, da Instrução Normativa n° 77/2015. Havendo erro administrativo, o INSS deverá promover a revisão do benefício concedido ao segurado a fim de lhe assegurar o melhor benefício, em respeito ao princípio da aplicação da norma mais favorável ao segurado.

Algumas perguntas recorrentes ainda se apresentam em nosso escritório ( RETIRAR) . São elas: E no caso daqueles segurados que já estavam com pedidos de aposentadoria por tempo de contribuição agendados no INSS ou em tramite na justiça?

“Nessa situação, primeiro devemos fazer o cálculo para verificar se a fórmula efetivamente beneficia o segurado. Em caso positivo, basta pedir a reafirmação da data de entrada do requerimento (DER) ou o próprio cancelamento daquele agendamento anterior para efetivar um novo, sempre com muita atenção para observar se realmente há vantagens ou bom retorno econômico para o segurado.

Nesse sentido, já decidiu o TRF da 4ª Região:

“EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL. TERMO INICIAL. REAFIRMAÇÃO DA DER.

1. São pré-requisitos autorizadores dos embargos de declaração a omissão, contradição ou obscuridade na decisão embargada. Também a jurisprudência os admite para a correção de erro material e para fim de prequestionamento.
2. Se o segurado implementa todas as condições para a concessão do benefício previdenciário após a DER e antes da conclusão do processo administrativo, admissível a reafirmação da DER para a data da implementação, consoante previsto pelas próprias Instruções Normativas do INSS.(TRF-4 – ED: 50075561120134047001 PR 5007556-11.2013.404.7001, Relator: ROGERIO FAVRETO, Data de Julgamento: 09/06/2015, QUINTA TURMA, Data de Publicação: D.E. 10/06/2015)”

Também no curso do processo judicial que pleiteava a aposentadoria por tempo de contribuição – e à luz dos mesmos valores de natureza constitucional-processual – é determinada a observância de fato superveniente que possa influenciar a relação jurídica colocada em discussão, nos termos do artigo 493 do novo CPC (“Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento do mérito, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a decisão”). (Precedente da 1ª Turma Recursal- Juizo C da Seção Judiciária do Paraná- PROCESSO ELETRÔNICO Nº200870500054321/PR [4])

E os aposentados com o fator previdenciário que já sacaram a sua aposentadoria, ainda tem jeito?

Nesse caso, se continuaram ou continuarem contribuindo , sugerimos a “desaposentarão”, mas já deixamos claro que o processo está em julgamento pelo STF e que aguarda conclusão final sobre a tese. Deve-se ingressar com a ação, no entanto, para garantir a correção através dos juros e correção monetária.
Enfim, com base nos esclarecimentos supra apontados, concluímos que a aposentadoria dos pontos não foi verdadeiramente criada com o objetivo de beneficiar o segurado que, ao retardar o momento de se aposentar é beneficiado com a exclusão da aplicação do tão temido fator previdenciário do cálculo de sua aposentadoria. O ideal seria a exclusão do fator previdenciário sem o uso da idade como parâmetro dos cálculos. (essa era a tese do PT quando votou contra o fator previdenciário na gestão FHC).

No nosso sentir, quem começou a trabalhar mais cedo tem o direito “ moral’ e legítimo de se aposentar mais cedo sem aplicação de nenhuma fórmula que usurpe parte dos seus vencimentos. O tão falado equilíbrio atuarial já foi alcançado com os anos de contribuição e a longevidade de alguns não desiquilibraria o sistema, senão vejam-se o estudo da ANFIP que demonstra ser a previdência superavitária, não fosse a colocação de benefícios de caráter assistencial às custas da previdência.

É salutar requerer a declaração incidental de inconstitucionalidade de alterações legais supervenientes que denotem retrocesso social e extinção de direitos mais vantajosos. Contudo, ao verificar que a regra, no caso concreto, gera vantagens ao segurado, por óbvio que não nos convém fazer aquele pedido. Depois de esclareceros pontos a serem discutidos em juízo, também é prudente deixar a decisão pelo caminho a seguir nas mãos do segurado.
Infelizmente, ninguém bate à porta do cidadão para dizer que tem direitos, mas, ao revés, sempre que há deveres, alguém aparece para cobrá-lo. Por isso, usamos sempre o canal da “ informação” a fim de tentar fazer da nobre profissão da advocacia um instrumento de ação social contra a alienação e a favor do usufruto dos direitos negados pelo Estado Administrador.

Obs: O presente texto tem o caráter meramente ” informativo” e não tem intenção de induzir ao leitor a litigar.
Informa, sim, os eventuais direitos dos leitores e sua opção por contratar um advogado da sua confiança, já que este profissional é indispensável à administração da Justiça, é defensor do Estado Democrático de Direito, dos direitos humanos e garantias fundamentais, da cidadania,da moralidade, da Justiça e da paz social, cumprindo-lhe exercer o seu ministério em consonância com a sua elevada função pública e com os valores que lhe são inerentes, entre eles o dever de “informar” à sociedade os seus potenciais direitos para que, com isso, se alcance a tão sonhada justiça social, tudo conforme preceito básico contido no art. 2º do Código de Ètica da advocacia.

 

Fernanda Campos – Advogada; Sócia Fundadora do Escritório Carvalho Campos & Macedo Sociedade de Advogados; Presidente do IPEDIS; Especialista em Direito Público; Trabalho e Processo do Trabalho; Previdenciário e Securitário; Professora, palestrante e Conferencista; Graduanda em Ciências Contábeis; Co-autora do Livro: Ônus da prova no Processo Judicial Previdenciário- Editora Juruá, 2018