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Ação Previdenciária no JEF independe de quando foi feito o requerimento administrativo – Prazo decadencial de dois anos criado pelo juiz é ilegal

A exigência de renovação do requerimento administrativo a cada seis meses, um ano, dois anos (contados do indeferimento administrativo à data do ajuizamento da ação), tem sido utilizada por muitos juízes federais dos Juizados Especiais Federais Brasil a fora.

Há algum tempo, um magistrado de Juiz de Fora-MG começou a adotar esse tipo de decisão como forma, talvez, (e, aqui, apenas uma suposição) de dar um upgrade na sua produtividade e talvez “ganhar um prêmio Diamante do CNJ[1], quem sabe?

Foram tantos os recursos à 1ª  Turma Recursal de Juiz de Fora que, depois de, talvez, um “conselho” dos seus pares, tal decisão passou a não ser mais utilizada. Mas foi muita gente que saiu prejudicada. Segurados que contavam com experientes advogados previdenciários interpuseram os recursos, reclamaram tutela de urgência e colocaram o “trem nos trilhos”. E quem provocou a jurisdição pela via da atermação? E aquele que contou com o trabalho de um advogado pouco experiente ou de outra área (não especialista em Processo Civil ou Previdenciário)?

Ora, é cediço que tais prazos decadenciais não possuem qualquer base normativa, além de ser restritiva do exercício de direito constitucional da inafastabilidade da jurisdição. Se os Tribunais Superiores consideraram ser necessário o prévio requerimento administrativo para ajuizar ação de concessão de benefício previdenciário ou assistencial, não se pode impedir o respectivo direito de ação quando já existe esse requerimento administrativo, mesmo que de longa data. É bom que se avisem aos Juízes (“aqueles que conhecem o Direito – Iura novit Curia) que Eles  “não podem restringir mais do que o legislador quis restringir” e, aqui, uma referência ao brocado ubi lex non distinguir nec nos distinguere debemus.

Consoante os fatos jurídicos acontecidos antes das micro e macro reformas da Previdência Social Brasileira (e, nesse contexto, importante lembrarmos do brocado tempus regit actum), o Superior Tribunal de Justiça já tem firme posicionamento no sentido de que a decadência somente era observável nos casos em que se debatia a “revisão de benefícios” já concedidos, mas não em casos de simples “indeferimento do benefício previdenciário”. Tal entendimento foi baseado na afirmação de que o direito ao benefício acaba se incorporando ao patrimônio jurídico da pessoa, atraindo, portanto, apenas a prescrição das parcelas devidas e não cobradas no prazo de 5(cinco) anos, mas não ao fundo do direito.

No julgamento do REsp 1.461.695/PR, de relatoria do Ministro Sérgio Kukina, o STJ assim se manifestou:

RELATOR: MINISTRO SÉRGIO KUKINA. RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS. ADVOGADO: PROCURADORIA-GERAL FEDERAL – PGF. RECORRIDO: CARLOS MARTINS DA COSTA PASSOS. ADVOGADO: MARCO ANTONIO GROTT E OUTRO (S) DECISÃO: Trata-se de recurso especial manejado com fundamento no art. 105IIIa, da CF, contra acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, assim ementado (fl. 228): PREVIDENCIÁRIO. DECADÊNCIA DO DIREITO DE REVISÃO. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL: RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nº. 626.489/SE. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA: RECURSO ESPECIAL Nº. 1.326.114/SC. INOCORRÊNCIA. INDEFERIMENTO ADMINISTRATIVO. Não há decadência quando o pedido administrativo de concessão de benefício tiver sido indeferido pela Autarquia Previdenciária, incidindo apenas a prescrição qüinqüenal sobre as prestações vencidas. Opostos embargos declaratórios, foram rejeitados ante a inexistência dos vícios elencados no art. 535 do CPC. A parte recorrente aponta violação aos arts. 535 do CPC, 103, caput, da Lei n. 8.213/91. Para tanto, sustenta que (I) houve negativa de prestação jurisdicional; e (II) ocorrendo a negativa administrativa do benefício vindicado, o segurado tem 10 anos para pleitear a revisão do ato de indeferimento, na via judicial. É o relatório. Verifica-se, inicialmente, não ter ocorrido ofensa ao art. 535 do CPC, na medida em que o Tribunal de origem dirimiu, fundamentadamente, as questões que lhe foram submetidas, apreciando integralmente a controvérsia posta nos presentes autos. Ressalte-se que não se pode confundir julgamento desfavorável ao interesse da parte com negativa ou ausência de prestação jurisdicional. Quanto à questão de fundo, cumpre destacar que não há falar em decadência do direito de concessão de benefício previdenciário, eis que o caput do art. 103 da Lei n. 8.213/91 somente é aplicável em relação à revisão de benefício já concedido. De outro vértice, este Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento no sentido de que, por se tratar de relação de trato sucessivo, o decurso do prazo entre a negativa por parte do INSS e o eventual ajuizamento de ação judicial não tem o condão de fulminar o direito do segurado à obtenção do benefício, motivo pelo qual, no ponto, não há o que reparar no acórdão recorrido. Nesse sentido: PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PRESCRIÇÃO DE FUNDO DE DIREITO. INAPLICABILIDADE NAS DEMANDAS PREVIDENCIÁRIAS QUE ENVOLVEM RELAÇÕES DE TRATO SUCESSIVO E ATENDEM NECESSIDADES DE CARÁTER ALIMENTAR, RAZÃO PELA QUAL A PRETENSÃO À OBTENÇÃO DE UM BENEFÍCIO É IMPRESCRITÍVEL. AGRAVO REGIMENTAL DO INSS DESPROVIDO. 1. As normas previdenciárias primam pela proteção do Trabalhador Segurado da Previdência Social, motivo pelo qual os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido de amparar a parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui proteção legal que lhe garante a flexibilização dos rígidos institutos processuais. 2. Os benefícios previdenciários envolvem relações de trato sucessivo e atendem necessidades de caráter alimentar, razão pela qual a pretensão à obtenção de um benefício é imprescritível. 3. É firme o entendimento desta Corte de que, cumpridas as formalidades legais, o direito ao benefício previdenciário incorpora-se ao patrimônio jurídico do beneficiário, não podendo ser objeto, dest’arte, de modificação ou extinção. 4. Agravo Regimental do INSS desprovido. (AgRg no AREsp 311.396/SE, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 20/03/2014, DJe 03/04/2014 – grifo nosso) PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. PRESCRIÇÃO. ART. 103PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI 8.213/1991. INDEFERIMENTO DE BENEFÍCIO. NEGATIVA EXPRESSA DO INSS. FUNDO DE DIREITO. IMPOSSIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO DO ART. 103 DA LEI 8.213/1991. DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO. 1. A autarquia previdenciária pretende configurar a prescrição do fundo de direito em razão de o benefício ter sido negado administrativamente, com amparo no art. 103parágrafo único, da Lei 8.213/1991 e na Súmula 85/STJ. 2. O STJ sedimentou compreensão de que não há prescrição do fundo de direito dos benefícios previdenciários do Regime Geral de Previdência Social, e que tal instituto somente atinge as parcelas sucessivas anteriores ao prazo prescricional. Nesse sentido: AgRg no REsp 1.384.787/CE, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 10.12.2013; AgRg no REsp 1.096.216/RS, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Sexta Turma, DJe 2.12.2013. 4. A interpretação contextual do caput e do parágrafo único do art. 103 da Lei 8.213/1991 conduz à conclusão de que o prazo que fulmina o direito de revisão do ato de concessão ou indeferimento de benefício previdenciário é o decadencial de dez anos (caput), e não o lapso prescricional quinquenal (parágrafo único) que incide apenas sobre as parcelas sucessivas anteriores ao ajuizamento da ação. 5. A aplicação da prescrição quinquenal prevista no parágrafo único do art. 103 da Lei 8.213/1991 sobre o fundo de direito tornaria letra morta o previsto no caput do mesmo dispositivo legal. 6. Agravo Regimental não provido. (AgRg no AREsp 451.468/SE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 11/03/2014, DJe 19/03/2014- grifo nosso) No julgamento do AgRg no AREsp 506.885/SE, DJe 02/06/2014, tive a oportunidade de me manifestar sobre o tema, conforme se observa da seguinte ementa: PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO NEGADO NA VIA ADMINISTRATIVA. PRESCRIÇÃO DO FUNDO DE DIREITO. INOCORRÊNCIA. SÚMULA 85/STJ. INAPLICABILIDADE. 1. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que, mesmo na hipótese de negativa de concessão de benefício previdenciário e/ou assistencial pelo INSS, não há falar em prescrição do próprio fundo de direito, porquanto o direito fundamental a benefício previdenciário não pode ser fulminado sob tal perspectiva. 2. Em outras palavras, o direito à obtenção de benefício previdenciário é imprescritível, apenas se sujeitando ao efeito aniquilador decorrente do decurso do lapso prescricional as parcelas não reclamadas em momento oportuno. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no AREsp 506.885/SE, de minha relatoria, PRIMEIRA TURMA, julgado em 27/05/2014, DJe 02/06/2014) Ante o exposto, nego seguimento ao recurso especial. Publique-se. Brasília (DF), 02 de fevereiro de 2015. MINISTRO SÉRGIO KUKINA Relator (Ministro SÉRGIO KUKINA, 09/02/2015)” (grifos nossos)

No mesmo sentido, o STJ, ao julgar o Agravo em REsp nº 474585/CE, de relatoria do Ministro Og. Fernandes, assim decidiu:

AGRAVANTE: INSS INSTITUTONACIONAL DO SEGURO SOCIAL. ADVOGADO: PROCURADORIA-GERAL FEDERAL – PGF AGRAVADO: JOAQUIM PINHEIRO TORRES JUNIOR. ADVOGADO: FRANCISCO GREGÓRIO NETO E OUTRO (S). DECISÃO: Vistos, etc. Trata-se de agravo interposto pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS contra decisão que inadmitiu recurso especial interposto em oposição a acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal – 5.ª Região, em conformidade com o relatório e voto constantes dos autos às e-STJ, fls. 142/151. Embargos de declaração rejeitados (e-STJ, fls. 162/167). Nas razões da via excepcional, fundada nas alíneas a e c do permissivo constitucional, sustenta a parte interessada que o aresto impugnado, ao não reconhecer a prescrição do fundo de direito do autor, além de violar o disposto nos arts.  do Decreto n. 20.910/32 e 103, parágrafo único, da Lei n. 8.213/91, dissentiu dos julgados indicados como paradigmáticos. Salienta, quanto ao tema, que, “(…) tendo em vista que o direito vindicado no presente feito remonta à 10/2/1998 – fl. 18 e, considerando que a presente ação somente foi ajuizada em 18/6/2010 – fl/s. 10, encontra-se a mesma irremediavelmente tomada pela prescrição extintiva” (e-STJ, fl. 173). O Tribunal de origem negou seguimento ao apelo à consideração de que o exame da insurgência encontra óbice no quanto disposto pela Súmula 83/STJ. A teor das razões tecidas com o agravo, afirma-se, entretanto, que os requisitos necessários ao prosseguimento do aludido recurso principal se encontram devidamente demonstrados. É o relatório. Preenchidos os requisitos de admissibilidade e suficientes as razões indicadas para conferir trânsito ao recurso, passo a analisar o mérito da via excepcional. Nos termos da firme compreensão jurisprudencial desta Corte, uma vez que os benefícios previdenciários estão ligados à própria dignidade do segurado, constituindo direito social e integrando, por conseguinte, o quadro dos direitos fundamentais, não ocorre prescrição do fundo de direito dos benefícios previdenciários do Regime Geral da Previdência Social, posto que tal instituto alcança apenas as parcelas relativas ao quinquênio anterior à propositura da demanda. A propósito: PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DECADÊNCIA. NÃO OCORRÊNCIA. ART. 103 CAPUT DA LEI 8.213/1991 APLICÁVEL AO ATO DE REVISÃO DO BENEFÍCIO. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. No presente caso, o benefício previdenciário ainda não foi concedido. O caput do art. 103 da Lei 8.213/1991 está voltado tão somente para o ato revisional de concessão do benefício. Prescrição do fundo de direito não há, quando se trata de concessão de benefício previdenciário, inserido no rol dos direitos fundamentais. 2. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp 493.997/PR, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 3/6/2014, DJe 9/6/2014) – grifos acrescidos PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. PRESCRIÇÃO. ART. 103PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI 8.213/1991. INDEFERIMENTO DE BENEFÍCIO. NEGATIVA EXPRESSA DO INSS. FUNDO DE DIREITO. IMPOSSIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO DO ART. 103 DA LEI 8.213/1991. DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO. 1. A autarquia previdenciária pretende configurar a prescrição do fundo de direito em razão de o benefício ter sido negado administrativamente, com amparo no art. 103parágrafo único, da Lei 8.213/1991 e na Súmula 85/STJ. 2. O STJ sedimentou compreensão de que não há prescrição do fundo de direito dos benefícios previdenciários do Regime Geral de Previdência Social, e que tal instituto somente atinge as parcelas sucessivas anteriores ao prazo prescricional. Nesse sentido: AgRg no REsp 1.384.787/CE, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 10.12.2013; AgRg no REsp 1.096.216/RS, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Sexta Turma, DJe 2.12.2013. 4. A interpretação contextual do caput e do parágrafo único do art. 103 da Lei 8.213/1991 conduz à conclusão de que o prazo que fulmina o direito de revisão do ato de concessão ou indeferimento de benefício previdenciário é o decadencial de dez anos (caput), e não o lapso prescricional quinquenal (parágrafo único) que incide apenas sobre as parcelas sucessivas anteriores ao ajuizamento da ação. 5. A aplicação da prescrição quinquenal prevista no parágrafo único do art. 103 da Lei 8.213/1991 sobre o fundo de direito tornaria letra morta o previsto no caput do mesmo dispositivo legal. 6. Agravo Regimental não provido. (AgRg no AREsp 451.468/SE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 11/3/2014, DJe 19/3/2014) – grifos acrescidos PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PRESCRIÇÃO DE FUNDO DE DIREITO. INAPLICABILIDADE NAS DEMANDAS PREVIDENCIÁRIAS. RELAÇÃO DE TRATO SUCESSIVO. INDEFERIMENTO ADMINISTRATIVO. APLICAÇÃO DO PRAZO DECADENCIAL DECENAL PREVISTO NO ART. 103 DA LEI 8.213/91. AGRAVO REGIMENTAL DO INSS DESPROVIDO. 1. As normas previdenciárias primam pela proteção do Trabalhador Segurado da Previdência Social, motivo pelo qual os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido de amparar a parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui proteção legal que lhe garante a flexibilização dos rígidos institutos processuais. 2. Os benefícios previdenciários envolvem relações de trato sucessivo e atendem necessidades de caráter alimentar, razão pela qual a pretensão à obtenção de um benefício é imprescritível. 3. As prestações previdenciárias tem características de direitos indisponíveis, daí porque o benefício previdenciário em si não prescreve, somente as prestações não reclamadas no lapso de cinco anos é que prescreverão, uma a uma, em razão da inércia do beneficiário, nos exatos termos do art. 3o. Do Decreto 20.910/32. (…) 6. Agravo Regimental do INSS desprovido. (AgRg no REsp 1.364.155/SE, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 10/12/2013, DJe 19/12/2013) – grifos acrescidos Infere-se, pois, diante desse quadro, que o aresto impugnado, ao afastar a prescrição do fundo de direito, reconhecendo apenas aquela relativa às parcelas anteriores à propositura da ação, se pôs em sintonia com a orientação jurisprudencial desta Corte sobre a matéria. Assim, o recurso encontra óbice no quanto disposto pela Súmula 83/STJ, segundo a qual “não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida“. Ante o exposto, com fulcro no art. 544§ 4º, inc. IIb, do CPC, conheço do agravo para negar seguimento ao recurso especial. (…) ( grifos nossos)

Importante, nessa linha, trazer à baila trecho do posicionamento do Supremo Tribunal Federal sobre o tema, quando do julgamento do RE 626489/SE:

EMENTA: RECURSO EXTRAODINÁRIO. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL (RGPS). REVISÃO DO ATO DE CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. DECADÊNCIA. 1. O direito à previdência social constitui direito fundamental e, uma vez implementados os pressupostos de sua aquisição, não deve ser afetado pelo decurso do tempo. Como consequência, inexiste prazo decadencial para a concessão inicial do benefício previdenciário. 2. É legítima, todavia, a instituição de prazo decadencial de dez anos para a revisão de benefício já concedido, com fundamento no princípio da segurança jurídica, no interesse em evitar a eternização dos litígios e na busca de equilíbrio financeiro e atuarial para o sistema previdenciário. 3. O prazo decadencial de dez anos, instituído pela Medida Provisória 1.523, de 28.06.1997, tem como termo inicial o dia 1º de agosto de 1997, por força de disposição nela expressamente prevista. Tal regra incide, inclusive, sobre benefícios concedidos anteriormente, sem que isso importe em retroatividade vedada pela Constituição. 4. Inexiste direito adquirido a regime jurídico não sujeito a decadência. 5. Recurso extraordinário conhecido e provido. (grifos nossos).

Noutro julgamento didático sobre o assunto, o STJ assim se posicionou:

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE AMPARO ASSISTENCIAL À PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO. INDEFERIMENTO DE BENEFÍCIO. NEGATIVA EXPRESSA DO INSS. INTERPRETAÇÃO DO ART. 103 DA LEI 8.213/1991. 1. A interpretação contextual do caput e do parágrafo único do art. 103 da Lei 8.213/1991 conduz à conclusão de que o prazo que fulmina o direito de revisão do ato de concessão ou indeferimento de benefício previdenciário é o decadencial de dez anos (caput), e não o lapso prescricional quinquenal (parágrafo único) que incide apenas sobre as parcelas sucessivas anteriores ao ajuizamento da ação. 2. Não fosse assim, a aplicação do entendimento de que a prescrição quinquenal prevista no parágrafo único do art. 103 da Lei 8.213/1991 pode atingir o fundo de direito tornaria inócuo o instituto da decadência previsto no caput do mesmo artigo, que prevê prazo de dez anos para o exercício do direito de revisão de ato de indeferimento ou de concessão de benefício previdenciário. 3. Na hipótese dos autos, conforme se extrai do acórdão recorrido, houve negativa do benefício em 10.6.2008 e a ação foi proposta em 6.6.2016, não havendo falar em decadência, tampouco prescrição, do direito de rever o ato que indeferiu o benefício de amparo assistencial à pessoa portadora de deficiência. 4. Recurso Especial provido. (STJ – REsp: 1697578 PB 2017/0244603-0, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 07/12/2017, T2 – SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 19/12/2017)

Recentemente, enfrentando novamente o tema, o Superior Tribunal de Justiça, em especial quanto a ratio decidendi, ora grifada, assim se manifestou:

ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CONCESSÃO DE PENSÃO POR MORTE ESTATUTÁRIA. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. TRANSCURSO DE PRAZO SUPERIOR A CINCO ANOS DA DATA DO ÓBITO DO SERVIDOR. IRRELEVÂNCIA. APLICABILIDADE DA SÚMULA 85/STJ. TERMO INICIAL DA PRESCRIÇÃO A PARTIR DO INDEFERIMENTO ADMINISTRATIVO DO BENEFÍCIO. PRECEDENTE DA PRIMEIRA SEÇÃO DO STJ. ERESP 1.269.726/MG. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. I. (…) III. Recentemente, a Primeira Seção desta Corte, em sessão realizada em 13/03/2019, nos autos dos EREsp 1.269.726/MG (Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJe de 20/03/2019), reexaminou a matéria, à luz do decidido pelo STF, no RE 626.489/SE, sob o regime da repercussão geral, no sentido de que não há prazo para a formulação de requerimento inicial de benefício previdenciário da Lei 8.213/91, “que corresponde ao exercício de um direito fundamental relacionado à mínima segurança social do indivíduo (STF, RE 626.489/SE, Rel. Ministro ROBERTO BARROSO, TRIBUNAL PLENO, DJe de 23/09/2014). (…) VIII. Agravo interno improvido. (STJ – AgInt no REsp: 1648249 MG 2017/0008891-4, Relator: Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, Data de Julgamento: 21/09/2020, T2 – SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 25/09/2020) (grifos nossos)

A Turma Nacional de Uniformização da Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais- TNU, também não deixou passar à largo a apreciação da matéria e, inclusive, editou a Súmula 81, em 24/06/2015, alterada em 09/012/2020, a partir do julgamento do PEDILEF nº 510396-02.2018.4.05.8300/PE, nos seguintes termos:

QUESTÃO DE ORDEM. SÚMULA 81 TNU. ALTERAÇÃO. ADEQUAÇÃO AO A TEMA 975 DO STJ E AO TEMA 265 DA TNU. REDAÇÃO ALTERADA.

1. No julgamento do Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei (PUIL) 0510396-02.2018.4.05.8300/PE, representativo da controvérsia vinculada ao tema 265 da Turma Nacional de Uniformização, foi fixada a seguinte tese: a impugnação de ato de  indeferimento, cessação ou cancelamento de benefício previdenciário não se submete a qualquer prazo extintivo, seja em relação à revisão desses atos, seja em relação ao fundo de direito.

2. O teor do voto condutor faz expressa menção ao tema 975 do Superior Tribunal de Justiça, no qual foi fixada a seguinte tese: aplica-se o prazo decadencial de dez anos estabelecido no art. 103, caput, da Lei 8.213/1991 às hipóteses em que a questão controvertida não foi apreciada no ato administrativo de análise de concessão de benefício previdencário.

3. Por outro lado, o enunciado 81 da súmula da jurisprudência dominante na Turma Nacional de Uniformização, aprovado em 18/06/2015, apresenta a seguinte redação: não incide o prazo decadencial previsto no art. 103, caput, da Lei n. 8.213/91, nos casos de indeferimento e cessação de benefícios, bem como em relação às questões não apreciadas pela Administração no ato da concessão.

4. A evolução do entendimento pretoriano exige uma atualização do referido verbete, autorizada na forma do art. 35, § 2º do Regimento Interno desta Turma Nacional. Desse modo, proponho que o enunciado adote redação idêntica à da tese fixada no julgamento do tema 265.

5. Nova redação do enunciado 81 da súmula da jurisprudência dominante na Turma Nacional de Uniformização: a impugnação de ato de  indeferimento, cessação ou cancelamento de benefício previdenciário não se submete a qualquer prazo extintivo, seja em relação à revisão desses atos, seja em relação ao fundo de direito.

ACÓRDÃO

A Turma Nacional de Uniformização decidiu, por unanimidade, ALTERAR A REDAÇÃO DO ENUNCIADO DA SÚMULA 81 para que passe a adotar os seguintes termos: “a impugnação de ato de indeferimento, cessação ou cancelamento de benefício previdenciário não se submete a qualquer prazo extintivo, seja em relação à revisão desses atos, seja em relação ao fundo de direito”. Brasília, 09 de dezembro de 2020. (grifos nossos)

Está-se, portanto, diante do direito de ação em face de indeferimento administrativo do pedido, que não pode ter ressalvas criadas pela figura de “juízes heróis” que se arvoram na função de legisladores e criam prazos decadenciais conforme sua própria vontade, muitas vezes sob o argumento de que, agindo assim, reduzirão a litigiosidade e conterão eventuais “aventureiros”.

Os lapsos temporais -de dois anos, 1 ano, seis meses- criados para os requerimentos administrativos, a fim de que sejam úteis à propositura de ação judicial, nos casos de benefícios previdenciários por incapacidade temporária e de BPC ( e qualquer outro beneficio previdenciário), são excrescências jurídicas e devem ser exemplarmente combatidos pelos advogados previdenciaristas pelas vias recursais próprias, bem como a partir da denunciação dos respectivos juízes prolatores da decisão ao Tribunal correspondente através do instituto da “ correição parcial”.

No âmbito do TRF1, a correição parcial está prevista no artigo 279 do Regimento Interno do Tribunal e assim disciplina: “Art. 279. Caberá correição parcial contra ato ou despacho de juiz de que não caiba recurso, bem como omissão que importe erro de ofício ou abuso de poder.”

Sempre que o cidadão buscar a tutela judicial, recomenda-se que esteja acompanhado de advogado/defensor de sua confiança. Isso, pois, apesar da oferta do jus postulandi na Justiça Federal, há casos em que a análise fática; a instrução probatória; e a argumentação trazida pelo patrono farão toda a diferença na concessão do direito e, inclusive, na percepção de parcelas pretéritas e eventuais indenizações pelo dano moral gerado.

Nesse sentido, não é demais relembrar a dicção do artigo 133 da Constituição Federal de 1988, que diz: ” Art. 133. O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.”

 

Fernanda Carvalho Campos e Macedo – Advogada; Sócia Fundadora do Escritório Carvalho Campos & Macedo Sociedade de Advogados; Presidente do IPEDIS; Especialista em Direito Público; Trabalho e Processo do Trabalho; Previdenciário e Securitário; Professora, palestrante e Conferencista; Graduanda em Ciências Contábeis; Co-autora do Livro:  Ônus da prova no Processo Judicial Previdenciário- Editora Juruá, 2018

[1] https://www.cnj.jus.br/pesquisas-judiciarias/premio-cnj-de-qualidade/