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Entendendo a revisão da vida toda

Por Fernanda Carvalho Campos e Macedo

 

Há tempos, vinha se arrastando no judiciário a discussão sobre a possibilidade da revisão dos cálculos da renda mensal inicial das aposentadorias de quem tivesse boas contribuições para a previdência, anteriores ao ano de 1994. Essa modalidade de revisão do cálculo do valor da aposentadoria foi chamada de “revisão da vida toda”.

Mas, em linhas mais claras, do que se trata essa modalidade de revisão?

A chamada “revisão da vida toda” é uma modalidade de recálculo do benefício de aposentadoria que permite a inclusão, no cálculo da RMI (renda mensal inicial) os valores contribuídos ao INSS em períodos anteriores a julho de 1994, já que as contribuições anteriores a essa data eram, até então, descartadas pela autarquia previdenciária.

A tese foi proposta há algum tempo, mas as decisões divergentes no primeiro e no segundo grau de jurisdição davam o tom da “insegurança jurídica”. Diante disso, uma vez provocado o STJ (Superior Tribunal de Justiça), este, no ano de 2018, afetou dois Recursos Especiais para julgamento da matéria no rito dos recursos repetitivos (modalidade de julgamento que garante certa segurança jurídica, já que a tese, ali firmada, deve ser seguida por juízes de primeiro e segundo graus).

A questão específica que fora posta em julgamento questionava a possibilidade de aplicação da regra definitiva prevista no art. 29, I e II da Lei 8.213/1991, na apuração do salário de benefício, quando mais favorável do que a regra de transição contida no art. 3º da Lei 9.876/1999, aos Segurados que ingressaram no sistema antes de 26.11.1999 (data de edição da Lei 9.876/1999). O STJ, então, no final de 2019, decidiu que deveria prevalecer a tese de que o segurado da previdência social poderia, sim, optar pelo melhor benefício.

Insatisfeito, o INSS interpôs o presente Recurso Extraordinário, alegando em síntese, má aplicação dos dispositivos constitucionais pelo STJ.

No Supremo Tribunal Federal – STF, o julgamento encontrava-se com a votação empatada em 5 X 5, faltando o voto de minerva do ministro Alexandre de Moraes, que desempatou a votação, votando para favorecer os aposentados do INSS.

Ocorre que, no dia 08/03/2022, o recém nomeado Ministro Kassio Nunes Marques, fez um pedido de “ destaque”, levando, conforme regras regimentais, o processo à “ estaca zero”. Depois de  muita luta dos advogados e Institutos Previdenciários, firmou-se a tese no STF de que mesmo após o pedido de destaque, o voto do então aposentado Ministro Marco Aurélio deveria contar na nova votação do tema.

Para felicidade dos segurados, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu, novamente, por maioria de votos, a possibilidade de aplicação de regra mais vantajosa à revisão da aposentadoria de segurados que tenham ingressado no Regime Geral de Previdência Social (RGPS) antes da Lei 9.876/1999, que criou o fator previdenciário e alterou a forma de apuração dos salários de contribuição para efeitos do cálculo de benefício.

A matéria foi discutida no Recurso Extraordinário (RE) 1276977, com repercussão geral (Tema 1.102). Prevaleceu o entendimento de que, quando houver prejuízo para o segurado, é possível afastar a regra de transição introduzida pela lei, que exclui as contribuições anteriores a julho de 1994.

Não é incomum nos depararmos com segurados que, no passado, contribuíam com altas quantias para a Previdência Social e, com a alteração legislativa, passou a ter aqueles melhores salários de contribuição desprezados pelo sistema de cálculos do INSS. Todavia, não se pode dizer que todos os recálculos de benefícios resultarão em vantagem financeira para o cidadão.

É preciso, sempre, consultar um profissional especializado em Direito Previdenciário, a fim de que este faça uma avaliação do histórico contributivo do aposentado e, após, apresente um diagnóstico do seu caso. Em algumas hipóteses, até mesmo outras modalidades de revisão podem ser apontadas (inclusão de período laborado em condições especiais e sua respectiva conversão; tempo de trabalho rural etc).

É certo que, em alguns casos, já se viu revisões de aposentadoria que geraram acréscimo patrimonial superior a 50% dos vencimentos do aposentado.  Mas também já se apurou, em alguns casos, a desvantagem dos cálculos revisionais em relação ao salário de benefício do segurado.

É necessário ressaltar que os segurados cujos benefícios de aposentadoria foram concedidos, antes de novembro de 1999, não possuem direito a citada revisão, já que não houve, por claro, a incidência da Lei 9876/99. Além disso, há de se observar o prazo decadencial para propositura de eventual ação judicial.

Fernanda Campos – Advogada; Sócia Fundadora do Escritório Carvalho Campos & Macedo Sociedade de Advogados; Presidente do IPEDIS; Especialista em Direito Público; Trabalho e Processo do Trabalho; Previdenciário e Securitário; Professora, palestrante e Conferencista; Graduanda em Ciências Contábeis; Co-autora do Livro: Ônus da prova no Processo Judicial Previdenciário- Editora Juruá, 2018