As obras em prédios constituídos em condomínios edilícios- quórum de aprovação e cautelas necessárias
Fernanda Carvalho Campos e Macedo – Advogada; Sócia Fundadora do Escritório Carvalho Campos & Macedo Sociedade de Advogados; Presidente do IPEDIS; Especialista em Direito Público; Trabalho e Processo do Trabalho; Previdenciário e Securitário; Professora, palestrante e Conferencista; Graduanda em Ciências Contábeis; Co-autora do Livro: Ônus da prova no Processo Judicial Previdenciário- Editora Juruá, 2018
A estrutura normativa dos condomínios edilícios teve importantes alterações nos últimos anos e, por isso, é necessário que o síndico e os condôminos estejam alertas às regras legislativas e regulamentares ou, em alguns casos, contem com a correspondente assessoria jurídica de forma a evitar prejuízos e consternações desnecessárias.
É cada vez mais comum os projetos habitacionais que contemplam, num mesmo condomínio, grandes áreas comuns que não se limitam àquelas tradicionais. Há casos de projetos condominiais que se constituem em verdadeiros clubes de convivência, com piscinas comunitárias, quadras poliesportivas, áreas de churrasco, saunas, entre outros.
Existem prédios que contam com uma estrutura híbrida, residencial e comercial, com a presença de bares, restaurantes, academias de ginástica, clínicas de estética entre outros, geralmente no andar térreo.
Cada situação, portanto, reclamará uma atenção diferenciada para as exigências legais e regulamentares para o caso de obras em áreas comuns e a classificação daquelas, conforme disposição do Código Civil e das respectivas Convenções de Condomínio.
A Lei 10.406/2002 ( Código Civil ) dispõe, em seu artigo 1.331, o seguinte: “ Pode haver, em edificações, partes que são propriedade exclusiva, e partes que são propriedade comum dos condôminos.”
Em relação às obras nas propriedades comuns, o Código Civil disciplina, conforme a classificação daquelas (Úteis, voluptuárias e necessárias), em seu Art. 1.341, incisos e parágrafos, as regras sobre quórum de aprovação por assembleia entre condôminos. Nesse sentido, vale a transcrição dos dispositivos mencionados:
Art. 1.341. A realização de obras no condomínio depende:
I – se voluptuárias, de voto de dois terços dos condôminos;
II – se úteis, de voto da maioria dos condôminos.
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- 1 o As obras ou reparações necessárias podem ser realizadas, independentemente de autorização, pelo síndico, ou, em caso de omissão ou impedimento deste, por qualquer condômino.
- 2 o Se as obras ou reparos necessários forem urgentes e importarem em despesas excessivas, determinada sua realização, o síndico ou o condômino que tomou a iniciativa delas dará ciência à assembleia, que deverá ser convocada imediatamente.
- 3 o Não sendo urgentes, as obras ou reparos necessários, que importarem em despesas excessivas, somente poderão ser efetuadas após autorização da assembleia, especialmente convocada pelo síndico, ou, em caso de omissão ou impedimento deste, por qualquer dos condôminos.
- 4 o O condômino que realizar obras ou reparos necessários será reembolsado das despesas que efetuar, não tendo direito à restituição das que fizer com obras ou reparos de outra natureza, embora de interesse comum.
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Passemos, então, as classificações das obras para que o leitor possa entender melhor o dispositivo legal supratranscrito. De forma resumida, as benfeitorias necessárias ( que não dependem de aprovação da assembleia de condôminos, mas apenas da decisão do síndico ou de qualquer condômino) têm como finalidade a conservação do imóvel, ou evitar que o mesmo se deteriore. Exemplos: reparos de um telhado, reparos nos rebocos da fachada pelos quais se constam infiltrações e oxidação das ferragens estruturais; substituição de sistemas elétricos que possam causar curto circuito ou outro tipo de dano etc.
As benfeitorias úteis são aquelas que aumentam ou facilitam o uso do bem. construção de uma garagem, a instalação de grades protetora nas janelas ou fechamento de uma varanda, porque tornam o imóvel mais confortável, seguro ou ampliam sua utilidade.
As benfeitorias voluptuárias são as que, de alguma forma, adicionam luxo, conforto ou deleite, não aumentando o seu uso habitual, mesmo que o torne mais agradável ou lhe eleve o valor. Exemplos: Obras de paisagismo em jardinagem; obras de decoração meramente estética; colocação de mármores no Rol de Entrada etc.
Apesar da disciplina do Código Civil acima mencionada, sempre recomendamos que o síndico seja o mais democrático que puder e, sempre que possível, informe aos condôminos sobre a necessidade de obras, mesmo que estas sejam, a seu sentir, necessárias e dispensem a respectiva autorização. Até por que, as classificações em benfeitorias úteis, voluptuárias e necessárias sempre foram objeto de muita divergência pela jurisprudência pátria.
Há casos em que as obras indicadas guardam características tanto de necessárias, quanto de úteis, quanto de voluptuárias, ao mesmo tempo, a depender do intérprete. Vamos a um exemplo:
Um prédio com 8 apartamentos tem visíveis danos na sua fachada e laterais, entre os quais se destacam: a) Necessidade de reparo no reboco devido a aparência da ferragem oxidada e as infiltrações decorrentes das falhas; b) trincas no reboco ( que podem ser de natureza estrutural ou mesmo da dilatação da estrutura e da não flexibilidade do material usado no reboco; c) Problemas de pintura antiga e deteriorada; d) Revestimentos soltos que causam infiltração; d) Forros de lambri deteriorados por infiltração.
Verificados os problemas acima exemplificados, o síndico poderia propor aos condôminos, a contratação de empresa especializada para verificação daqueles e para emissão de parecer técnico cumulado ou não com o orçamento para realização as obras de reparo sobre os danos verificados. Após a emissão do parecer e do orçamento, certamente seria possível a verificação da necessidade, utilidade ou desnecessidade da realização das obras.
Entretanto, em alguns casos como o acima citado, reparos úteis ou necessários podem se converter em voluptuários quando a reforma que se pretende realizar se dê com material luxuoso ou de qualidade muito superior, mesmo que aumentem o valor do imóvel e o torne mais agradável do que outrora.
Daí surgiriam controvérsias sobre o quórum necessário para a aprovação da obra e eventuais discussões sobre responsabilidade dos condôminos para o adimplemento da obra.
É, nesse sentido, que sempre recomendamos aos síndicos a observância das convenções condominiais e das normas relacionadas às obras antes de sua realização. Em alguns casos que fomos contratados por síndicos para assessoria jurídica preventiva e para o acompanhamento das questões jurídicas relacionadas aos contratos relacionados às reformas, sempre recomendamos a consulta em assembleia para formação de quórum, independente da classificação prévia que fazemos das benfeitorias a serem realizadas.
Nesse sentido, observem-se o julgado abaixo, do Tribunal de Justiça de São Paulo sobre a classificação das obras e o quórum necessário para aquelas:
Tribunal de Justiça de São Paulo. Agravo de Instrumento. 0254275-95.2012.8.26.0000 – Relator: Carlos Henrique Miguel Trevisan – Comarca: São Paulo – Órgão julgador: 4ª Câmara de Direito Privado – Data do julgamento: 17/01/2013 – Data de registro: 18/01/2013 – Outros números: 2542759520128260000 – Condomínio. Ação de anulação de assembleia. Vícios de forma e conteúdo. Deliberações em afronta à convenção e ao ordenamento jurídico Questionamentos em relação ao quórum mínimo de votação. Decisão de primeiro grau que indefere pedido de tutela antecipada voltado a anular a assembleia. Agravo interposto pelo autor. Despesas a envolver, na maior parte, obras úteis, de caráter voluptuário e em áreas comuns. Quórum mínimo de votação desrespeitado. Inteligência do artigo 1.341, incisos I e II, e do artigo 1.342, ambos do Código Civil. Parcial presença dos requisitos legais da relevância das razões do recurso e do perigo de dano de difícil reparação. Situação de fato que enseja a concessão parcial da tutela antecipada. Agravo provido em parte.
O Sindico pode, inclusive, contar com a assessoria jurídica durante a assembleia para explicar as implicações normativas relacionadas aos danos, a responsabilidade de cada um, os riscos, a necessidade ou não de Alvará da Prefeitura para realização da obra, as normas de segurança, a necessidade ou não de projeto e ART ( Assinatura de Responsabilidade Técnica), a liquidez das empresas candidatas à execução da obra ( isso é muito importante para a questão da garantia na execução dos serviços) e, principalmente, sobre a necessidade ou não de contratação de seguro para obra.
É sempre importante estar atento às questões legais e normativas pré e pós contratuais. Já verificamos casos de grandes prejuízos diante da informalidade de procedimentos e das tentativas de economias que, ao final, geraram grandes “dores de cabeça”. Por isso, insistimos que antes de realizar uma obra, procure um advogado especialista nesta matéria, que seja da sua confiança, para que um parecer prévio possa, ao menos lhe gerar a segurança jurídica necessária para avançar nas etapas necessárias.